Muito relutantemente acabei ouvindo a dica de um amigo a
respeito de um filme que ele havia assistido no Netflix. A propaganda foi muito
boa, e confesso ter demorado para conferir justamente por conta disso, quando ficamos
com aquele receio da expectativa arruinar a experiência que algo poderia nos
trazer. No caso, isso não aconteceu e foi uma experiência fantástica a que eu
tive assistindo sozinho, no silêncio do meu quarto, a esse filme que agora eu indico.
Aliás, aconselho que, antes de continuar a leitura, assista ao filme, ele se
chama “Circle” e, além do Netflix eu não faço ideia de onde possa ser
encontrado.
Comecei com um pé atrás, mas a imersão provocada pelo
início começou a me ganhar. A luz baixa, ficando mais clara conforme as pessoas
em volta do círculo iam acordando pareceu estar dizendo que eu despertava para
o filme tal como cada um deles, e eu mal sabia que essa meta linguagem estava
só começando.
De repente um raio e “bum”. Um dos cinquenta cai e não se
levanta mais. Alguma coisa o puxa para além da vista dos demais e fim. Assim,
sem explicação, sem pedir permissão, sem que ninguém soubesse quem era. Ele
morreu. Tal como a morte acontece na vida das pessoas. Talvez para os mais
próximos faça falta. Talvez não houvesse nenhum conhecido. Todos se assustaram
como que houve. Se importaram com a possibilidade de ser o próximo, jamais com
o sujeito. A gente vê muito isso na vida.
Passa um tempo, outro raio. Mais um tempo, outro raio. E
o ciclo se repete até que decidem fazer alguma coisa. Alguém assume a posição
de porta-voz. Descobrem que podem votar em quem seria o próximo, levam em conta
algum argumento aceito pela maioria. E a minoria? Eles estavam sendo votados,
tentando explicar porque as coisas não deveriam ser assim. E atingidos pelos
raios antes de concluírem. De tempo em tempo alguém vai morrer, então, vamos
fazer algo com esse tempo ou vamos nos lamentar? Julgar os demais? Discutir?
Até que ponto isso é “fazer alguma coisa”? Aquelas cinquenta pessoas, agora um
pouco menos, formam um círculo, e nas nossas vidas fazemos parte de alguns. Em
que circunstâncias votamos ou somos votados a deixar de fazer parte deles? Em
quais deles estamos tomando esse raio nos fundilhos?
O porta-voz é acertado pelo raio após se enrolar em seus
argumentos. Acho que já ouvi falar de alguém que tomou a frente em uma situação
problemática, apresentou uma solução que foi aceita pela maioria e depois foi execrado
por elas. E assim acontece mais algumas vezes. Começam então argumentos mais
pessoais, apelam para uma possível ética, ataques com e aos mais variados
preconceitos, julgamentos fervorosos em determinado momento fica bastante
evidente que o que mais diz respeito sobre cada um é a forma como julga os
outros. E então começo a ver como tem uns caras mais sensatos que outros, e
como tem uns filhos da puta. Como conseguem julgar os outros só pelas
aparências e algumas frases que acabaram de dizer? Mas peraí... é exatamente o
que eu estou fazendo enquanto assisto, já que estou com eles ao mesmo tempo que
cada um dos outros.
Alguns começam a se lembrar onde estavam quando foram
parar no círculo, e mesmo que alguns não se lembrem, uns afirmam ter absoluta
certeza de que existem outros círculos. Mesmo sem lembrar direito, eles sabem
que existe algo além daquilo ali e que vieram de algo anterior a aquilo.
Caramba, de onde vimos e para onde vamos... e dois minutos depois... raio na
cara. E quem diz que esse raio mata? Ele pode só desmaiar e quem sabe, de
repente acordar em outro círculo. Esse raio pode apagar sua memória desse
círculo. Aaaaah, são tantas possibilidades, são tantas dúvidas, mas não há
tempo para pensar em tudo isso já que são perguntas sem resposta, uma vez que o
tempo aqui é limitado. É preciso “fazer algo”.
Chegando no final, e a minha conclusão a respeito é que...
devo assistir de novo, talvez prestando mais atenção, pois o final me pareceu
meio besta, e não acho que a vida seja essa besteira.